Nos últimos anos, a relação das gerações mais jovens com o transporte tem sido objeto de estudo em todo o mundo. A Geração Z, composta por indivíduos nascidos entre 1998 e 2009, desafia tendências globais ao demonstrar maior interesse em adquirir um carro próprio quando comparada aos millennials (Geração Y, nascidos entre 1982 e 1997). Esse fenômeno, identificado por uma pesquisa brasileira realizada pela Localiza, destaca a crescente relevância do automóvel entre os jovens brasileiros e as razões que os motivam, mesmo em um cenário de crescente conscientização ambiental e alternativas de transporte coletivo.
Resultados do estudo “Mobilidade através das gerações”
A pesquisa, que entrevistou 1.600 brasileiros acima de 18 anos, revelou que 92% dos jovens da Geração Z pretendem comprar um carro ou trocar o veículo que já possuem, mesmo que ainda não tenham definido um prazo. Dentro desse grupo, mais da metade afirmou que deseja concretizar esse objetivo nos próximos três anos. Apenas 7% indicaram não ter interesse em adquirir ou trocar um automóvel.
Esse dado chama atenção, especialmente quando comparado ao comportamento de outras gerações. Entre os millennials, por exemplo, o número de pessoas que não pretendem investir em um carro nos próximos três anos sobe para 17%. Já na Geração X (1961-1981), composta por pessoas em sua maioria acima dos 40 anos, esse número cresce ainda mais, atingindo 27%. Por outro lado, os Baby Boomers (1945-1960) apresentam um comportamento misto: apenas 20% deles manifestaram interesse em trocar ou adquirir um veículo nos próximos três anos.
Esses números sugerem que, à medida que envelhecem, os brasileiros tendem a se distanciar da posse de um veículo próprio, possivelmente priorizando alternativas de mobilidade mais práticas e econômicas. O que surpreende, no entanto, é o engajamento da Geração Z com os automóveis, especialmente em contraste com a percepção global de que os jovens estão cada vez menos interessados nesse tipo de posse.
Por que a Geração Z quer um carro próprio?
A Geração Z é frequentemente associada à valorização da conveniência e da personalização. No estudo da Localiza, 62% dos entrevistados de todas as gerações destacaram a conveniência e a economia de tempo como fatores determinantes para a escolha de seu meio de transporte. No caso da Geração Z, isso parece se traduzir em um interesse maior por veículos próprios, que oferecem flexibilidade e praticidade para deslocamentos cotidianos.
Além disso, 44% dos entrevistados afirmaram que a possibilidade de ir direto ao destino é uma das vantagens de ter um carro. Para a Geração Z, que cresceu em um contexto onde o tempo é um recurso valioso, a possibilidade de evitar a dependência de transportes coletivos ou de aplicativos pode justificar o desejo pelo automóvel. Outros fatores, como trajetos mais rápidos (33%) e horários exatos de partida e chegada (30%), também foram apontados como importantes.
Curiosamente, o custo não aparece como prioridade para muitos jovens. Apenas 19,1% da Geração Z afirmou que escolhe o meio de transporte baseado no preço. Esse dado reflete uma mudança de mentalidade, em que a praticidade e a experiência de mobilidade têm mais peso do que o custo financeiro direto.
Contraponto: estudos globais sobre a Geração Z e os automóveis
O cenário brasileiro, contudo, difere significativamente das tendências observadas em outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, apenas 54% dos integrantes da Geração Z demonstraram interesse em possuir um carro, segundo uma pesquisa realizada em 2023. Esse percentual é inferior aos 62% dos millennials americanos que manifestaram o mesmo desejo.
Além disso, o número de adolescentes americanos que possuem habilitação para dirigir caiu drasticamente nas últimas décadas: de 43% em 1997 para apenas 25% em 2020. Esse dado reflete um desinteresse crescente pelos automóveis como símbolo de liberdade e independência, especialmente em comparação com gerações anteriores.
Outro estudo, conduzido pela McKinsey em 2023, indicou que a Geração Z global está mais aberta a explorar alternativas de mobilidade, como transporte público, bicicletas, scooters elétricas e serviços de compartilhamento de veículos. Essa flexibilidade contrasta com a visão brasileira, onde o automóvel continua sendo percebido como uma necessidade básica para muitos jovens.
Fatores culturais e econômicos que influenciam o Brasil
Para entender por que os jovens brasileiros da Geração Z têm maior interesse em carros do que seus pares em outros países, é necessário considerar os fatores culturais e econômicos locais. O Brasil, com sua vasta extensão territorial e infraestrutura limitada de transporte público em muitas regiões, torna a posse de um veículo quase indispensável para quem busca autonomia e praticidade.
Além disso, o carro no Brasil ainda é visto como um símbolo de status e independência. Enquanto em países como os Estados Unidos ou na Europa o transporte coletivo é amplamente utilizado e eficiente, no Brasil muitos jovens enxergam o carro como uma forma de escapar das limitações do transporte público, que frequentemente é superlotado, inseguro e pouco confiável.
A economia também desempenha um papel importante. A popularização dos carros financiados e o aumento da oferta de modelos acessíveis facilitam o acesso ao primeiro veículo. Programas de incentivo ao crédito, descontos em veículos novos e a valorização dos seminovos tornam o sonho do carro próprio mais alcançável para muitos brasileiros, incluindo os jovens da Geração Z.
Millennials e o declínio do interesse por automóveis
Os millennials, por outro lado, apresentam um comportamento mais alinhado com as tendências globais. Essa geração, que cresceu em um período de crise econômica e com o surgimento de alternativas digitais, como aplicativos de transporte, desenvolveu uma relação mais pragmática com os automóveis.
Para muitos millennials, o custo de manutenção, combustível e seguros não justifica a posse de um carro, especialmente em grandes cidades onde o transporte por aplicativo é amplamente acessível. Além disso, essa geração foi pioneira no uso de tecnologias que facilitam a mobilidade urbana, como serviços de compartilhamento de bicicletas e patinetes elétricos.
Outro ponto relevante é o impacto ambiental. Os millennials tendem a ser mais conscientes sobre as questões ecológicas e a buscar alternativas sustentáveis, como transporte coletivo e veículos elétricos. Isso contrasta com a Geração Z, que, embora também esteja preocupada com o meio ambiente, parece priorizar a conveniência e a flexibilidade no momento de escolher seu meio de transporte.
O futuro da mobilidade no Brasil
A discrepância entre os comportamentos da Geração Z e dos millennials no Brasil reflete uma transição em curso no setor de mobilidade. Embora o carro continue a ser uma escolha importante para muitos jovens brasileiros, é provável que essa realidade mude à medida que novas tecnologias e opções de transporte sustentável se tornem mais acessíveis.
Carros elétricos e híbridos, por exemplo, estão começando a ganhar espaço no mercado brasileiro, e a Geração Z pode desempenhar um papel crucial na adoção dessas tecnologias. Além disso, melhorias na infraestrutura de transporte público e o avanço de sistemas de mobilidade compartilhada podem oferecer alternativas viáveis para quem busca maior flexibilidade sem os custos e responsabilidades de possuir um veículo.