O mercado de ônibus brasileiro vive um momento de otimismo, e a Mercedes-Benz está no centro dessa expansão. A montadora alemã, líder histórica do segmento, projeta um 2025 com crescimento sustentável, impulsionado pela retomada do transporte coletivo, investimentos em mobilidade urbana e a crescente demanda por soluções de fretamento. Com dados que apontam para um potencial de 25 mil unidades licenciadas até o final do ano – alta de 10% em relação a 2024 –, a empresa consolida sua estratégia em três frentes: manutenção da liderança em segmentos tradicionais, expansão em nichos específicos e avanço gradual na eletrificação, ainda que com desafios estruturais.
Os números do primeiro trimestre de 2025 já sinalizam esse movimento. Foram mais de 5.500 ônibus licenciados no país, um salto de 35% ante o mesmo período do ano anterior. Esse desempenho reflete não apenas a recuperação econômica, mas também a confiança dos operadores em renovar suas frotas. Walter Barbosa, vice-presidente de vendas e marketing da Mercedes-Benz Ônibus, destaca que o setor vive um “ciclo de crescimento sustentável”, com oportunidades em todas as categorias, desde os urbanos até os rodoviários. Apesar de alguns segmentos apresentarem bases menos favoráveis, como os micro-ônibus, a montadora enxerga potencial em nichos emergentes, como o fretamento rural, que demanda veículos adaptados a condições adversas.
Liderança em segmentos estratégicos e apostas em nichos
A Mercedes-Benz mantém sua hegemonia em categorias cruciais. Nos ônibus urbanos, que registraram alta de 15% no primeiro trimestre (com mais de 2 mil unidades), a empresa detém mais de 70% de participação. Esse domínio é resultado de uma combinação entre tecnologia embarcada, robustez dos chassis e uma rede de serviços pós-venda reconhecida pelo mercado. Já no fretamento, onde o volume ainda é menor (647 unidades no trimestre, com crescimento de 70%), a marca alemã controla metade do mercado. Um dos lançamentos recentes, o chassi LO 916R, foi desenvolvido especificamente para aplicações rurais, com suspensão elevada, pneus mistos e proteção reforçada para o cárter – detalhes que atendem a demandas específicas de regiões como o Centro-Oeste e Sudeste.
O segmento de rodoviários, por sua vez, enfrenta um cenário mais desafiador. Com queda de 20% no trimestre (471 unidades), a categoria ainda busca recuperação após um ano atípico em 2024. No entanto, a Mercedes mantém o otimismo. “Ano passado foi fora da curva. Apesar da queda, 2025 será positivo”, afirma Barbosa. Já os micro-ônibus, mercado altamente competitivo e orientado por preço, representam um desafio adicional. A empresa ocupa a terceira posição, com 25% de participação, mas concentra esforços em diferenciais como durabilidade e custo-benefício a longo prazo.
Eletrificação: potencial limitado pela infraestrutura
A descarbonização do transporte coletivo é uma prioridade global, mas no Brasil esbarra em obstáculos estruturais. Atualmente, o país conta com 664 ônibus elétricos em operação, dos quais 449 circulam em São Paulo. A Mercedes-Benz tem 111 unidades próprias e outras 111 chassis fornecidos para a Eletra, sua parceira no desenvolvimento de veículos a bateria. Dois modelos destacam-se no portfólio: o eO500U, com capacidade para 80 passageiros e 250 km de autonomia, e o articulado eO500UA, lançado recentemente para 120 passageiros e 300 km de alcance – este último já com encomendas para 2026.
Porém, o avanço da eletrificação depende de investimentos pesados em infraestrutura. A maioria das garagens de ônibus nas periferias das cidades opera com redes de baixa tensão, incapazes de suportar a recarga simultânea de frotas elétricas. Para viabilizar 100 veículos, por exemplo, seriam necessárias subestações de média/alta tensão, com custos entre R150milho~eseR150milho~eseR 170 milhões. “Esse é o grande gargalo”, reconhece o executivo. Enquanto isso, a Mercedes foca em soluções híbridas e no aprimoramento de motores a diesel, que ainda dominam o mercado.
Exportações e visão para o futuro
Além do mercado doméstico, a Mercedes-Benz amplia sua atuação internacional. O chassis OF 1721, desenvolvido para operações em altitudes elevadas (como a Cordilheira dos Andes), tem sido um dos carros-chefes nas exportações para países como Colômbia e Peru. Essa estratégia reforça o papel do Brasil como hub produtivo para a marca, capaz de atender demandas diversificadas.
Para os próximos anos, a empresa projeta um cenário de consolidação. Com investimentos em tecnologia, adaptação a normas de emissões e parcerias para eletrificação, a meta é manter a liderança em um mercado que deve superar 30 mil unidades anuais até 2030. O crescimento, porém, exigirá políticas públicas claras – especialmente para infraestrutura de energia e renovação de frotas. Enquanto isso, a Mercedes segue acelerando, com um pé no presente a diesel e outro no futuro elétrico.
Infraestrutura e Políticas Públicas: Os Pilares para o Crescimento Sustentável
O desenvolvimento do mercado de ônibus no Brasil está intrinsecamente ligado a dois fatores críticos: investimentos em infraestrutura e políticas públicas consistentes. Enquanto a Mercedes-Benz e outras montadoras avançam em tecnologias limpas e veículos mais eficientes, a falta de planejamento urbano e energético ameaça frear esse progresso. Cidades como São Paulo, que lideram a adoção de ônibus elétricos, já enfrentam gargalos logísticos, como a incapacidade das redes elétricas periféricas de suportar demandas de recarga em larga escala. Sem uma ação coordenada entre governos, concessionárias de energia e operadores de transporte, a transição para frotas sustentáveis pode ser mais lenta do que o necessário para cumprir metas ambientais. Walter Barbosa reforça que “não basta ter o veículo; é preciso criar ecossistemas viáveis”, citando a necessidade de subsídios para infraestrutura e linhas de crédito específicas para renovação de frotas.
Além dos desafios energéticos, a malha viária brasileira também exige atenção. Estradas em más condições aumentam os custos de operação e reduzem a vida útil dos veículos, especialmente em aplicações rurais e interestaduais. A Mercedes-Benz tem respondido a isso com chassis reforçados, como o LO 916R, mas alerta que soluções pontuais não substituem a necessidade de investimentos em rodovias e corredores exclusivos para ônibus urbanos. Projetos como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) poderiam ser redirecionados para incluir metas específicas de mobilidade, como a eletrificação de garagens ou a criação de corredores verdes – iniciativas que já mostram resultados em cidades europeias e asiáticas.
Por fim, a regulamentação desempenha um papel central. A falta de padrões nacionais para ônibus elétricos, por exemplo, gera insegurança jurídica para operadores e montadoras. Enquanto países como Chile e Colômbia avançam com leis que incentivam a descarbonização, o Brasil ainda carece de uma estratégia clara. “Precisamos de regras estáveis para atrair investimentos”, defende Barbosa. A aproximação entre setor privado e poder público será essencial para transformar o potencial de crescimento em realidade – garantindo que o mercado de ônibus não apenas cresça, mas evolua.